quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Regime caduco é o da nossa imprensa...Correia da Fonseca a revelar o carácter dos "intelectuais" de cartilha


«Profetas ou apologistas do regresso a uma ditadura?

Correia da Fonseca* - 12.12.09

Era um dos quotidianos debates a dois, ou afinal talvez de facto a três, com que habitualmente termina o Jornal das Nove da SIC Notícias.

De um lado estava João Soares, que desta vez e para esta crónica, com o devido respeito, não vai importar nada. Do outro lado estava Ângelo Correia, antiquíssimo ministro da Administração Interna de um governo de direita e, nos tempos actuais, opositor interno da doutora Manuela e apoiante, protector, talvez mesmo treinador, de Pedro Passos Coelho, o social-democrata que para alguns poderá ser o Messias que vem salvar o PSD do penoso purgatório para onde resvalou.


Falava-se, naturalmente, não apenas do Caso Face Oculta e de Armando Vara, como pelo menos então era praticamente obrigatório no telenoticiário gerido por Mário Crespo, mas também e talvez sobretudo da situação económico-financeira do País.


Este segundo tema era especialmente adequado naquele dia, pois haviam acabado de chegar e estavam portanto muito frescos os conselhos-advertências do Fundo Monetário Internacional no sentido do costume: pagar menos aos que trabalham, cortar-lhes direitos e «regalias», facilitar a vida aos empresários para que eles possam «produzir riqueza».


Este último ponto concretiza-se sempre, já se sabe, por interpostas mãos que são as mãos dos trabalhadores.
Estava-se a dizer ali, pois, que a vida está difícil para o mundo em geral e muito em especial para o nosso País.

Falava-se nas aflições do costume no plano da chamada macroeconomia: défice crónico e sempre crescente da balança comercial, dívida pública, endividamento externo e previsíveis dificuldades a curto prazo na obtenção de empréstimos no exterior.
E também, embora talvez um pouco à distância, da dimensão do desemprego. A isto acrescentava-se, também sem surpresa para ninguém, o desprestígio da Justiça e de «os políticos» perante a opinião pública. Houve ainda uma breve escala para referir o senhor Presidente da República e as infelicidades em que tropeçou no passado Verão.

Com tudo isto, e não garanto que isto tenha sido tudo, parece-me certo ter-se instalado um pouco naquele estúdio um ambiente de velório. Foi por essa altura que, para minha inquietação, ouvi Ângelo Correia anunciar, em tom profético, que lhe parecia ver sinais do «crepúsculo do regime».


Fiquei preocupado, e suspeito de que o mesmo terá acontecido a mais gente. A questão era a de saber a que regime se referia Ângelo Correia ao usar aquela fórmula pré-necrológica. Seria o regime republicano a ameaçar finar-se antes mesmo do seu centenário? Talvez não: para lá de uns roubos de bandeiras não tem havido sinais de grande pujança monárquica. Seria, céus!, o próprio regime capitalista? Era improvável: a contribuição do marxismo-leninismo para o pensamento de Ângelo Correia é manifestamente escassa, não poderia dar para tais audácias.

Então, que pensar? Lembrei-me de Alberto João Jardim e das suas frequentes diatribes contra aquilo a que ele chama «o sistema» e cuja substituição reclama. Seria aquilo? Talvez.
Mas lembrei-me então de outras personalidades que sobretudo em dias recentes têm vindo à TV dizer, de uma maneira ou de outra, que «isto não pode continuar». Dizem-no, e não sem razão.

Mas é preciso atentarmos no que está implícito, e por vezes mesmo explícito, na direcção dos disparos verbais que de lhes conferem um pouco o estatuto de profetas. A figura que me surge como exemplar dessa linha de análise, aliás nada difícil, é o dr. Medina Carreira com o seu ar terrífico de ave de rapina tocada pelo tempo, mas há várias outras.
E o ponto decisivo é que os seus discursos estão impressionantemente próximos do que diz o FMI.

É certo que apesar de tudo não se atrevem (ainda?) a preconizar um governo «muito determinado, de estabilidade assegurada e de longa duração» (cito de memória sem receio de atraiçoar o sentido), isto é, de facto uma ditadura suficientemente longa.
Mas é bem sabido que meia palavra basta para os bons entendedores. Volto um pouco atrás: «crepúsculo do regime»? Em troca de quê? Para onde? Podiam fazer o favor de se explicarem melhor?»

-retirado daqui.

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