sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

uma «regeneração» liberal?


Rui Ramos, comenta hoje no Correio da Manhã a edificação de um «novo regime» e de «outras lideranças políticas» para resolver o abismo que se acerca e já sentido pela Grécia e Irlanda.

Rui Ramos, ideologicamente liberal (neo ou clássico, tudo a mesma treta), é uma das figuras que aponta para a podridão do actual sistema, no entanto, caindo na reprodução da cassete que são os órgãos de eleição democrática os obstáculos à "purificação" desse mesmo sistema.

Quem caminhar pelos blogues de tendência liberal apercebe-se do desejo de "um novo regime", que purgue o actual, sem que realmente nenhum deles aponte qualquer solução a não ser as habituais medidas para a "redução da despesa pública", como o corte de ajudas sociais e despedimentos na Função Pública.

Para os liberais portugueses, estas medidas não só reduziriam o défice e o "peso do Estado", como serviriam de incentivo (obrigatório) a que as pessoas dependessem da iniciativa privada e do Mercado Livre para cumprir as necessidades às quais antes recorriam aos serviços públicos (que eles acreditam ser insustentáveis). Talvez lhes escape que o Capitalismo português produz 40% de pobres e são as ajudas sociais que atenuam estas desigualdades, além de que o sector empresarial do Estado tem vindo a ser desfeito a preço da chuva.

Apontando os problemas e revelando aos poucos as suas soluções, os liberais têm um desprezo especial pelos partidos políticos, com a excepção de uma admiração extemporânea pela sanha anti-função pública-Estado-ajudas sociais do CDS e de Paulo Portas. Contudo a posição conservadora dos populares no que toca aos valores familiares e aborto impede os liberais de realmente declararem um apoio mais aberto aos direitistas.

Os ideólogos desta facção política vão desde Adam Smith, Stuart Mill e a citações de alguns presidentes americanos, com especial referência a Ronald Reagan. São contudo os pensadores neoliberais que matematizaram a ciência económica, dando-lhe uma capa de solidez e seriedade, e borrifaram todas as políticas com a ortodoxia de que só o Mercado desregulado e plenamente livre pode suprir todas as necessidades das pessoas, como Milton Friedman e Hayek que são os pilares intelectuais dos nossos liberais. A «Liberdade de Escolha» de Friedman e o «Caminho para a Servidão» de Hayek são as suas "bíblias".

Quando confrontados com a pobreza crescente ou o desemprego, a sua reacção é uma de duas, ou culpam o Estado ou atribuem que numa "sociedade livre", a "responsabilidade pessoal" dita a fortuna de cada um.

Acreditam nos EUA como pátria e grande promotora da democracia, não por causa da mobilização popular que os americanos são capazes de vez em quando, mas porque democracia é uma palavra-virtude para legitimar o cartão branco dado ao Mercado para atropelar qualquer direito individual ou colectivo nesta nação e a actuação das administrações presidenciais americanas ao longo da História, iniciando conflitos atrás de conflitos não olhando ao número de mortos para parar qualquer ameaça à ideologia capitalista.

Aliás, as datas que marcaram a derrota do bloco socialista de Leste são largamente celebradas pelos liberais da mesma maneira que um português comemora o 5 de Outubro ou o 1 de Dezembro, como dias cheios de significado civilizacional, que encerra a vitória recente do Capitalismo global sobre o movimento operário e comunista do século XX.

São assim os nossos liberais. Por isso não admira que após se escondam em palavras-virtude como «liberdade» e «democracia» por não terem real coragem de assumir o reconhecimento das desigualdades e pobreza virais que o Capitalismo traz, depois não sejam sequer capazes de afirmar um projecto político que possa ser visto, analisado e exposto sob o olhar crítico de todos.

Medina Carreira, inenarrável criatura da "intelectualidade" mediática nacional, repete o argumento da "podridão do sistema" e do "excessivo endividamento público", propõe um regime presidencialista em substituição do actual. Um regime que não só permitiria uma maior promiscuidade das classes mais abastadas no financiamento das campanhas, dado elas serem oficialmente apartidárias, tendo o apoio de alguma força política nos bastidores, como inutilizaria ainda mais a Assembleia da República e a pluralidade partidária, que funciona como órgão principal de vigilância dos decretos e propostas que se tornarão leis e consequentemente terão um peso directo na sociedade e economia.

Há uns dias, um editorial do Wall Street Journal afirmava que o capitalismo é mais importante que a democracia. Os intelectuais liberais que divagam nos nossos programas televisivos e de rádio, colunas de opinião na imprensa e blogues, sem dizerem o mesmo vão deixando sinais que é nisso que realmente acreditam.

1 comentário:

filipe disse...

Com o meu pedido de desculpa, pelo erro na localização do comentário e para não induzir outros visitantes no erro, aqui fica onde deveria ter sido deixado:

Excelente texto!
Decerto em ligação estreita com esses fascistas, acobertados sob a máscara de "liberais", notícia recente afirma que o chefe do EMGFA portuuês - aliás, em linha com outros seus congéneres, p.ex. o brasileiro - veio defender a alteração das missões constitucionais das nossas FFAA, devendo estas passar a desenpenhar funções de segurança interna(!). Evidentemente, acima de todos estes (e manobrando-os) está quem, preocupado com as lutas e a crescente resistência dos povos aos ditames do imperialismo, vá implementando medidas de aumento da repressão sobre todos aqueles que pensam e agem em defesa das liberdades e da democracia.
Urge desmascará-los e combatê-los.

Fico aguardando o teu novo texto que referiste, sobre os "liberais" portugueses.
Abraço fraterno.