domingo, 22 de março de 2009


Em Roterdão, na Holanda, foi posta em prática a derradeira liberdade ao serviço do mercado: a liberdade de humilhar.

Nesta cidade holandesa, a empresa Fitness First que possui um ginásio decidiu aumentar a receita dos seus lucros através da publicidade. E o genial resultado desta jogada de marketing foi a transformação de uma simples paragem de autocarro numa balança encapotada.

O segredo foi fazer do assento uma balança que determina o peso, mostrando-o no vidro ao lado, onde habitualmente se colocam cartazes publicitários. Com a humilhação que o visado sofreria e o constrangimento de quem estivesse a olhar passar-se-ia a mensagem, de modo coercivo, a frequentar o ginásio. Não fossem as pessoas terem sentido de auto-estima e uma absurda vontade de manter algumas partes da sua identidade pessoal fora do enfoque público, a mágica do mercado funcionaria de novo: as pessoas, para não passarem vergonha da próxima vez que se sentassem numa paragem de autocarro, frequentariam o ginásio e a empresa que possui o ginásio viria subir os seus lucros.

Pena sermos todos humanos.

sábado, 21 de março de 2009


Aqui vai um texto do José Soeiro sobre a neura que perpassa os governos e os órgãos que chefiam e estruturam o ensino superior para propagandear o empreendedorismo á juventude.

«Na Universidade de Salamanca, os dois jornais universitários gratuitos disponíveis nos corredores dão uma pequena ideia das discussões e do senso comum dominante nas escolas do ensino superior. Ambos os jornais fazem da questão do emprego a principal notícia na primeira página.

O "Tribuna Universitária" anuncia que o "salão de emprego vence a crise" e o "Gaceta Universitária" tem como título que ocupa toda a capa uma pergunta que pressupõe toda uma visão do mundo: "és empreendedor ou vais para funcionário?". Três páginas inteiras são dedicadas a explicar, em tons de alarme, as razões da crise que assola aquele país: "cada vez mais jovens aspiram a trabalhar para o Estado", "jovens preferem um salário para toda a vida", "o estudo da consultora People Matters mostra que um em cada três jovens aspira a trabalhar na Administração Pública", "86% dos jovens valoriza como prioritário, na hora de escolher um emprego, os trabalhos que ofereçam um salário fixo e a possibilidade de conjugar o âmbito profissional com a vida pessoal".

As razões da crise e do desemprego estão portanto explicadas: falta à juventude "empreendedorismo". Nada mais fácil: de acordo com este raciocínio, as opções económicas e os problemas sociais têm como principais responsáveis as suas próprias vítimas. É simples. Individualiza-se o problema e apresenta-se como um enorme obstáculo ao desenvolvimento essa ideia descarada que (imagine-se!...) anda na cabeça dos jovens: o quererem ter um salário fixo, o quererem ter tempo para viver, o quererem conciliar a vida profissional com a vida pessoal, o quererem ter emprego com direitos (que, no meio da selva do mercado, vão sendo menos violados no sector público do que no privado...).

Por cá, o Governo Sócrates foi mais esperto. Uma vez que os falsos recibos verdes que proliferam na Administração pública começaram a dar demasiado nas vistas, encontrou-se uma solução "empreendedora". Neste preciso momento, centenas de pessoas que trabalhavam para o Estado como falsos trabalhadores independentes (ou seja, tendo horário, chefia, enquadramento numa equipa, etc. mas passando recibo verde) estão a ser forçados a constituir-se como empresas, a maior parte das quais unipessoais. Ou seja, em vez de terem um contrato de trabalho, terão de constituir-se como empresas para, depois, celebrarem um contrato com o Estado para continuarem a fazer a mesma coisa no interior dos próprios serviços do Estado. Com esta fórmula mágica, faz-se desaparecer os "recibos verdes" e transferem-se todos os riscos e toda a protecção social para os próprios trabalhadores, ou seja, para estes homens e mulheres-empresa.

Assim, idealmente, deixa de haver trabalhadores (que, como se sabe, têm o inconveniente de gozarem de alguns direitos consagrados e, por vezes, associarem-se para lutar por eles...) e passa a haver apenas empresas que trabalham para empresas. No meio disto, o nosso governo prepara-se provavelmente para anunciar mais um recorde nacional: o maior número de empresas per capita da Europa.


José Soeiro

sexta-feira, 13 de março de 2009

quarta-feira, 4 de março de 2009


«Se quer uma visão do futuro, imagine um carimbo na cara de cada pessoa - Para sempre.»
-George Orwell


O futuro chega à velocidade frenética de um TGV, ou melhor...de uma navegação pela net.

Na Finlândia, um dos tais paraísos de liberdade e justiça social que os Media tanto gostam de elogiar, acabou de aprovar a Lei Nokia.

Esta lei, com o nome da maior fabricante de telemóveis do mundo, permite que as empresas e instituições públicas tenham acesso à conta de e-mail dos seus empregados e a possibilidade de ver o destinatário, o remetente, o formato e o tamanho dos anexos e a hora de envio dos mails enviados.

A lei Nokia, assim chamada porque esta multinacional desde 2005 tem exercido um lóbi sobre o governo para aprovar a espionagem sem quartel aos seus trabalhadores, é um passo a mais para a perda de privacidade, neste caso, a privacidade electrónica.

Já há algum tempo na Suécia foi aprovada a permissão aos serviços secretos da espionagem de chamadas, correios electrónicos e faxes para o estrangeiro sem ordem judicial. Uma medida secundada pelo pretexto da luta contra o terrorismo.

E é assim, passo a passo, que se vai perdendo a liberdade, enquanto esta é embandeirada em arco por quem no-la retira.